Julho 24, 2025
Gonçalo Almeida Simões: “Portugal está na linha da frente da bioeconomia europeia”

Pelas condições naturais que tem, Portugal está na linha da frente da bioeconomia europeia, mas precisa de estratégia e de mais intervenção do Estado, segundo Gonçalo Almeida Simões, diretor-geral da Biond – Associação das Bioindústrias de Base Florestal desde abril de 2023, que promove a 5.ª edição do Prémio Floresta é Sustentabilidade, em parceria com o Correio da Manhã e o Jornal de Negócios, que conta com o apoio da PwC.

“É fundamental um plano que estabeleça uma visão de longo prazo para o setor, promova incentivos à gestão sustentável e que reconheça a floresta como produtora de bens públicos, justificando o investimento público direto”, defende Gonçalo Almeida Simões.

Qual tem sido a capacidade de inovação da floresta, das bioindústrias de base florestal para a economia portuguesa, e em que produtos se consubstancia?

A floresta portuguesa e as bioindústrias de base florestal demonstram uma elevada capacidade de inovação, consolidando-se como um setor estratégico para a economia nacional. Este dinamismo é visível no desenvolvimento de produtos de elevado valor acrescentado, tais como novas embalagens biodegradáveis, alinhadas com a economia circular e a redução do plástico; fibras têxteis de base celulósica, como alternativa sustentável às fibras sintéticas; e bioenergia, que contribui para a transição energética.

3.101

Euros

Só em 2023, o setor da pasta, papel e cartão exportou 3.101 milhões de euros, um valor 2,13 vezes superior às importações (1.455 milhões de euros).

Essa transformação põe Portugal na linha da frente da bioeconomia europeia, com forte impacto em exportações, criação de emprego e coesão territorial. Só em 2023, o setor da pasta, papel e cartão exportou 3.101 milhões de euros, um valor 2,13 vezes superior às importações (1.455 milhões de euros), garantindo um saldo comercial positivo e ajudando a reduzir o défice da balança de bens do país.

Além do peso económico, esta fileira tem uma relevância social e territorial profunda, especialmente nas zonas rurais e do interior, onde é responsável por transferir anualmente cerca de 325 milhões de euros para a economia local, contribuindo para a fixação de população, emprego qualificado e desenvolvimento regional.

Em resumo, as bioindústrias florestais portuguesas representam um exemplo de inovação sustentável, que alia valor económico, responsabilidade ambiental e impacto social, reforçando o seu papel como bioindústrias de futuro.

Quais são os principais desafios para as florestas e as indústrias de base florestal?

Os principais desafios enfrentados pelas florestas e pelas indústrias de base florestal em Portugal incluem a falta de matéria-prima, que é uma situação paradoxal num país que tem condições edafoclimáticas – do solo e do clima, que influenciam o desenvolvimento e a distribuição dos seres vivos, especialmente da vegetação – e uma indústria de excelência, mas a política florestal portuguesa não viabiliza o aproveitamento do potencial existente (proibição de plantação, obstáculos administrativos na rearborização, etc.).

Temos ainda a escassez de gestão ativa com muitas áreas florestais abandonadas, que aumentam a vulnerabilidade ao fogo e reduzem o seu potencial produtivo; a fragmentação da propriedade florestal, dificultando a gestão coordenada e eficiente dos recursos; o risco elevado de incêndios, que tem impacto direto na rentabilidade e sustentabilidade das florestas; as alterações climáticas com fenómenos como secas e aumento da temperatura, que tornam os ecossistemas mais frágeis; a falta de mão de obra qualificada e dificuldade de atrair investimento, dois fatores que limitam o desenvolvimento e a modernização do setor.

O setor tem apostado numa estratégia integrada de gestão florestal, assente em dados científicos e em tecnologia de ponta. As florestas intervencionadas, por exemplo, demonstram ser até quatro vezes mais resistentes ao fogo do que as não geridas.

 

Como é que o setor tem respondido a estes desafios?

Para responder a esses desafios, o setor tem apostado numa estratégia integrada de gestão florestal, assente em dados científicos e em tecnologia de ponta.

As florestas intervencionadas, por exemplo, demonstram ser até quatro vezes mais resistentes ao fogo do que as não geridas. Neste contexto, as políticas públicas, como o Plano de Intervenção para a Floresta 2025-2050, são fundamentais. O êxito dessas políticas depende de uma execução eficaz dos acordos de fileira, da coordenação entre os diferentes níveis de governação e de uma articulação real com os atores do território. Sem essa convergência, será difícil transformar o potencial florestal português num motor de desenvolvimento sustentável.

Modelo de economia circular

O que deveria ser feito para melhorar a rentabilidade da produção florestal, mas com equilíbrio?

Para melhorar a rentabilidade da produção florestal em Portugal, mantendo o equilíbrio ambiental, é fundamental adotar uma abordagem integrada que promova a gestão sustentável das florestas. Isso inclui a adoção de políticas públicas eficazes. O Estado deve assumir um papel mais ativo na criação de incentivos para a gestão florestal, combatendo o abandono e promovendo o valor económico sustentável da floresta, pois é isso que incentiva os produtores florestais. Isso passa por rever a legislação que limita novas plantações de determinadas espécies, como o eucalipto, e que dificulta em muito a sua rearborização, mesmo que feita de uma forma sustentável e segundo as melhores práticas internacionais.

E que outras medidas podem ser tomadas?

Gestão ativa e sustentável dos recursos: a floresta portuguesa, que ocupa 36% do território nacional, precisa de ser gerida de forma responsável, com intervenções como limpeza, adubação, correção de densidades e reflorestamento. Estas práticas aumentam a produtividade e reduzem os riscos de incêndios.

Valorização da floresta como ativo estratégico: é necessário consciencializar os proprietários e decisores políticos de que a floresta pode ser simultaneamente uma fonte de rendimento, um fator de equilíbrio ambiental e um instrumento de justiça social.

Parcerias público-privadas: a sinergia entre o setor público e privado é essencial. Exemplos como o da Biond, que já beneficiou quase 100.000 hectares e 10.000 produtores, por via dos seus programas operacionais, devem ser replicados com grande escala em todo o país com apoios públicos.

Qual é o potencial do modelo de economia circular e qual o impacto da cadeia de valor florestal?

O modelo de economia circular é transformador. Permite reduzir o desperdício, maximizar a utilização de recursos e promover ciclos de vida mais longos para os produtos.

As bioindústrias florestais são exemplos concretos desta transição, ao valorizarem todos os subprodutos do processo industrial, dando-lhes novos aproveitamentos na sua cadeia de produção ou permitindo que outras indústrias o façam.

A cadeia de valor florestal gera emprego em zonas rurais, contribui para o sequestro de carbono, promove biodiversidade e reduz a dependência de matérias-primas fósseis, tornando-se um motor sustentável para o desenvolvimento do país.

Candidaturas estão abertas até 30 de novembro para a 5ª edição do Prémio Floresta é Sustentabilidade da Biond

A 5.ª edição do Prémio Floresta é Sustentabilidade, cujas candidaturas estão abertas até 30 de novembro de 2025, representa um compromisso da Biond com a valorização da floresta portuguesa nas suas várias dimensões. “O Prémio Floresta é Sustentabilidade nasce do compromisso da Biond com a valorização da floresta portuguesa como um ativo estratégico, renovável e essencial para o futuro do país. Esta nova edição reforça a missão de reconhecer projetos, entidades e práticas que promovem uma gestão florestal sustentável, inovadora e integrada nos desafios da transição climática. O objetivo é estimular o reconhecimento público de boas práticas e fortalecer o papel da floresta na bioeconomia circular”, afirma Gonçalo Almeida Simões, diretor-geral da Biond. O responsável sublinha que “a participação no Prémio é uma oportunidade única para as organizações demonstrarem o seu compromisso com a sustentabilidade, diferenciarem-se pelo impacto positivo das suas ações”. Além disso, destaca o diretor-geral da Biond, “o reconhecimento público valoriza os territórios e atrai mais investimento, mais inovação e maior coesão entre os diferentes agentes da fileira florestal”. As candidaturas devem ser submetidas através do site https://www.premioflorestasustentabilidade.pt/ até ao dia 30 de novembro de 2025.

Source: Negócios

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